segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Sobre o Medo: analisando a Expedição Extremo Sul (parte 5)


Observe o contraste do clima psicológico da equipe Extremo Sul com o da equipe (isso é mostrado no DVD) que atingiu o cume em 1995. Abaixo a transcrição das falas na filmagem realizada por um dos alpinistas:

Steve:
Acho que estamos prontos para começar esta escalada....
Pena que não tem muita visibilidade.. Mas poderia ser bem pior. E para  padrões patagônicos está bem razoável.
[início da tentativa de cume, ao amanhecer do dia]

Tim:
 Agora o medo da alvorada passou. e foi substituído pelo entusiasmo de um dia lindo e uma boa escalada. Valeu a pena cada instante de medo.
(...)
Que sensação de conquista vir aqui em cima!
(...)
Escalar é uma atividade engraçada: num momento, você fica morrendo de medo e , no outro, você se sente no topo do mundo! E todo aquele medo parece ter valido a pena.
(...)
Nós achavamos que não íamos conseguir. Parecia que não ia dar. O clima não estava cooperando. O Jim torceu o pé e o Charlie deslocou o ombro. Parecia que estávamos sem sorte.É sempre uma dura sensação chegar ao topo de uma montanha! - e isso tem a ver com a descida. A descida é sempre uma hora nervosa para mim.
(...)
É uma sensação incrível chegar perto do cume de uma montanha. Dá a maior vontade de chegar lá em cima. (....) Estou prestes a escalar o tramo final até o cume. (...)
Que bom que chegou a hora, porque achamos que não íamos conseguir. Mas pelo menos tivemos o bônus de chegar ao cume oeste (do Sarmiento).
Agora olhe isso! Que vista! Bom trabalho! Parabéns!
[cumprimentos mútuos entre os três membros da equipe ao atingir o cume]

Cume oeste do Monte Sarmiento - 1995
Stephen Venables
Tim Macartney
John Roskelley

Um aspecto interessante que pode ser percebido acima é o da efemeridade do medo. Eu já pude sentir isso várias vezes: momentos em que o medo incomoda, a pilotagem fica difícil, a MOTO não deita na curva, e dali a algum tempo, tudo passa, sem que as condições de pilotagem tenham sido alteradas substancialmente. Trata-se de um fenômeno muito interessante. Ou seja: está com medo? Calma, ele VAI passar! Evite o desgaste exponencial e cumulativo que a sensação do medo causa quando não temos esse aspecto bem claro (que ele passível de diluição com o tempo por natureza).

Vale a pena deixar claro que tudo o que eu comentei não entra no mérito técnico dos alpinistas: a questão não é quanto que a equipe bem-sucedida estava melhor tecnicamente que a equipe Extremo Sul e por isso atingiu o cume e sim o que propiciou, ou melhor, qual o conjunto de atitudes que levou uma melhor condição psicológica para se TENTAR o cume.

Eu queria decifrar as coisas que são importantes. E estou contando não é uma vida de sertanejo, seja se for jagunço, mas a matéria vertente. Queria entender do medo e da coragem, e da gã que empurra a gente para fazer tantos atos, dar corpo ao suceder.” – Jagunço Riobaldo – Grande sertão: veredas – João Guimarães Rosa

Cada hora, de cada dia, a gente aprende uma qualidade nova de medo!” – Jagunço Riobaldo – Grande sertão: veredas – João Guimarães Rosa

Nenhum comentário:

Postar um comentário