domingo, 17 de outubro de 2010

A Arte de Pilotar o Medo


Essa semana li o livro acima do Álvaro Larangeira: A Arte de Pilotar o Medo.

Narra a realização do primeiro Costa a Costa 50 da América Latina (CC50 LA) - do Oceano Atlântico ao Pacífico em menos de 50 horas, através de 4 países (Brasil, Uruguai, Argentina e Chile), certificada pela Iron Butt Association.

Nessa aventura, o Álvaro conta com companhias ilustres: Beto Marshall (muuito estranho ler um livro onde um amigo é personagem: ficava imaginando a cara do Beto nos acontecimentos da narrativa), Ron Ayres (http://www.ayresadventures.com/) e Michael Kneebone (presidente da Iron Butt Association).

Consegui o livro em um sebo na web: a edição está esgotada.

Infelizmente o Álvaro, natural de Bagé, faleceu este ano. Em conversas com amigos gaúchos obtive informações de que a famíla, seus filhos, estariam se mobilizando para lançar um livro inédito do Álvaro (ele já tinha lançado, além desse que eu li, o livro também sobre MOTO chamado "O passeio" e "As filhas da mãe Joana" - livro de ficção) - bem como em lançar uma nova edição do "A Arte de Pilotar o Medo".

Leiam um trecho do livro:

[cena: rodando de moto na cordilheira dos Andes em direção ao Paso El Libertador, apreciando as nuvens negras adiante e a chuva que começava a cair:]

O Motociclista mais experiente do grupo era o Michael Kneebone (...). Depois de colocar a capa de chuva, ele se aproximou de mim e perguntou:


- Álvaro, is that rain dangerous?


- No Michael, don't worry about it.


Depois dessa conversa, subimos em nossas motocicletas e continuamos a viagem. Muito devagar, pois a chuva estava forte e a visibilidade era quase zero. A estrada continuava horrível. Superar as dificuldades da estrada era mais fácil do que superar o medo de enfrentar os Caracoles no meio da noite. Aquela pergunta do Michael estava batendo forte na minha cabeça. Será que ele estava com medo?

Pelo amor de Deus... os momentos mais aterrorizantes que passei na minha vida foram em tempestades na cordilheira. Se a pergunta do Michael fosse feita hipoteticamente para mim, eu responderia: - Michael, we are extremely fucked up!

Coragem maior é reconhecer o medo e ser sincero ou reconhecê-lo e mentir?

Muito legal ler esse livro para entrar na cabeça do Álvaro e saber as reações da sua psique frente ao perigo. Não é todo dia que a gente pode ouvir essas histórias de alguém tão experiente. Isso vale ouro.

Enquanto tem um monte de farsas por aí posando de Experiente Motociclista, com letras maiúsculas, existem algumas pérolas cheias de experiências para transmitir soltas por aí, como essa que o Álvaro deixou através do seu livro.

Muito bom seria se os que podem agregar valor VERDADEIRO gravassem, de alguma maneira, o seu testemunho.

A Antonela gravou o dela no seu livro. Eu tento colocar nesse blog e no meu site algum conteúdo que leve a reflexões sobre viagens de MOTO. Mas eu sei de gente que é mais inteligente que eu e a Antonela ao quadrado e que já rodou mais que eu e a Antonela à décima potência que poderia escrever coisas interessantes para quem tiver ouvidos (não é, Beto Marshall)?

Mas voltando à questão: Coragem maior é reconhecer o medo e ser sincero ou reconhecê-lo e mentir?

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

O medo

por Frédérick Leboyer


Quem não interrogou, um dia, sobre a vida?
Quem não procurou, alguma vez, saber o que ela é?
Perguntas bastante pretensiosas.
Todavia, há quem mais modestamente pergunta:
"Onde começa a vida? E quando?""
há uma resposta imediata, simples e evidente:
"A vida começa com o nascimento".
E toda a inquietação desaparece.
Certeza?
A vida começa com o nascimento...
É mesmo?
No ventre...
No ventre de sua mãe, a criança já não está viva? Ela não se mexe?
Sem dúvidas, ela se mexe. No entanto, segundo algumas pessoas. Ali só existe atividade reflexa.
Atividade reflexa! Não!
Hoje nós sabemos que, bem antes de "vir à luz" , a criança percebe a claridade. E escuta. E que, do seu cantinho escuro, ela espreita o mundo.
Sabemos nós que ela passa da vigília ao sono. E até mesmo que sonha!
Por isso, achar que a vida começa com o nascimento é um grande erro.
Mas então, o que é que começa quando a criança vem ao mundo? O que é isso senão a vida?
O que começa
é o medo. 
O medo e a criança
nascem juntos.
E nunca se deixarão.
O medo,
companheiro secreto,
discreto como a sombra
e, como ela, fiel, obstinado.
O medo
que não nos abandonará,
a não ser no túmulo, 
para onde, com fidelidade,
nos conduzirá.