29 de junho - terça-feira
Lá Guimarães Rosa nasceu e viveu até os 9 anos de idade incompletos. Lá seu pai era dono de uma venda, uma loja de "secos e molhados" - e lá manteve desde cedo contato com o universo sertanejo. Basta ler o seu discurso de posse na Academia Brasileira de Letras para se saber a importância de Cordisburgo em sua vida, e o afeto que mantinha por essa pequena cidade.
Lá pertinho (5 km, bem sinalizado) fica a gruta do Maquiné, com seus 7 grandes salões:
"E mais do que tudo, a Gruta do Maquiné - tão inesperada de grande, com seus sete salões encobertos, diversos, seus enfeites de tantas cores e tantos formatos de sonho, rebrilhando risos de luz - ali dentro a gente se esquecia numa admiração esquisita, mais forte que o juízo de cada um, com mais glória resplandecente do que uma festa, do que uma igreja" - trecho de O recado do morro - no Urubuquaquá, no Pinhém
Cedinho fui visitar a gruta. Depois do texto acima, não preciso dizer como ela é bonita. Vale a pena ser visitada. Salões enormes com grandes formações de deixar a gente boquiaberto.
Depois do almoço, de mais uma comidinha mineira básica (um feijãozinho tropeiro, um torresminho, que delícia!) - fui visitar o museu Casa de Guimarães Rosa.
Fica na casa da família, onde morou e onde o pai tinha a venda. A casa está muito bem conservada, conta com um pequeno acervo do escritor, com coisas simples como uma coleção de suas marcantes gravatas borboletas mas com peças de estimado valor, como a espada e bainha da posse na academia de letras (o fardão ele foi sepultado com ele - trata-se de uma tradição da academia - ele morreu três dias! (isso mesmo) após a posse), a máquina de escrever onde ele escreveu Grande Sertão: Veredas, uma pequena biografia da sua vida com fotos. A venda do pai, que ficava na parte da frente da casa, bem conservada, dá prá imaginar o menino Joãozito escondido embaixo do balcão escutando as histórias dos clientes, gente do sertão.
Agora, o principal patrimônio do museu eu não falei, são os meninos contadores de história do projeto Miguilim. Eles acompanham a visita ao museu, comentam sobre o acervo e depois contam histórias: para o meu grupo, um dos contadores recitou um trecho da história de Miguilim e outro contador recitou um texto do Guimarães falando da sua infância. Emocionante - e muito bom ver como os meminos conhecem e se interessam pela vida e pela obra do Guimarães Rosa. Fiquei muito feliz em testemunhar isso. Muito me entristecia ver que muitas pessoas por esses meus dias de viagem, nos diversos locais, sequer sabiam quem foi Guimarães Rosa.
Em frente ao museu, a estação de trem de Cordisburgo. Lá onde Sorôco embarcou sua filha e sua mãe para o hospício em Barbacena (de Sorôco, sua mãe, sua filha - conto de Primeiras Estórias).
Esse foi o último programa da Expedição ao Sertão. Assim como na viagem de 2007 a Ushuaia, em que cumprimos o último destino turístico em Alta Gracia, na Argentina, região serrana de Córdoba, no museu Casa del Che - museu feito na casa onde Ernesto Che Guevara passou a infância - agora termino esta expedição visitando o Museu de Guimarães Rosa. E assim como foi emocionante demais andar pelos corredores onde andou Che Guevara, no final da viagem que foi um tributo à memória e ao mito dos ideais de Che Guevara, hoje também foi especialmente emocionante conhecer o museu Casa de Guimarães Rosa e os meninos contadores de História do Projeto Miguilim - nessa expedição que foi um tributo à memória de João Guimarães Rosa e do vaqueiro Manuelzão, do mito de Riobaldo e Reinaldo, ou Diadorim, ou Maria Deodorina da Fé Bettancourt Marins, ao sertão que é do tamanho do mundo.
"Sertão é sem lugar. Sertão é o sozinho. Sertão é dentro da gente."
"O Sertão está em toda a parte. O Sertão é do tamanho do mundo"
"Sertão, - se diz -, o senhor querendo procurar, nunca não encontra. De repente, por si, quando a gente não espera, o sertão vem."
Com o coração apertado começo a despedida desses lugares pelos quais peregrinei nos últimos 10 dias, buscando referenciar meus passos na vida e na obra de Guimarães Rosa.
Amanhã tocar o pau prá São Paulo. As saudades me puxam prá lá.
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