sexta-feira, 10 de agosto de 2012

A despedida do Conselheiro

ANTÓNIO VICENTE MENDES MACIEL

PRÉDICAS

aos canudenses
e
um discurso sobre a república


Belo Monte
província da Bahia
12 de janeiro de 1897

 No dia 5 de outubro de 1897, em que as tropas legais sob o comando do general Artur Oscar de Andrade Guimarães assenhorearam-se vitoriosa e decisivamente do arraial de Canudos, dando busca no lugar denominado Santuário em que morou o célebre António Conselheiro, foi este livro encontrado, em uma velha caixa de madeira, por mim, que me achava como médico em comissão do governo estadual e que fiz parte da junta de peritos que no dia 6 exumou e reconheceu a identidade do cadáver do grande fanático.

Submetido ao testemunho de muitos conselheiristas, este livro foi reconhecido ser o mesmo que, em vida, acompanhava nos últimos dias a António Maciel - Conselheiro -

Bahia, março de 1898

João Pondé


[à pág. 624 do manuscrito segue-se:]

Praza aos céus que abundantes frutos produzam os conselhos que tendes ouvido; que ventura para vós se assim o praticardes; podeis entretanto estar certos de que a paz de Nosso Senhor Jesus Cristo, nossa luz e força, permanecerá em vosso espírito: Ele vos defenderá das misérias desse mundo; um dia alcançareis o prêmio que o senhor tem preparado (se converterdes sinceramente para Ele) que é a glória eterna. Como não ficarei completamente satisfeito sabendo da vossa conversão, por mim tão ardentemente desejada. Outra cousa, porém, não é de esperar de vós à vista do fervor e animação com que tendes concorrido para ouvirdes a palavra de Deus, o que é uma prova que atesta o vosso zelo religioso. Antes de fazer-vos a minha despedida, peço-vos perdão se nos conselhos vos tenho ofendido. Conquanto em algumas ocasiões proferisse palavras excessivamente rígidas, combatendo a maldita república, repreendo os vícios e movendo o coração ao santo temor de Deus, todavia não concebam que eu nutrisse o mínimo desejo de macular a vossa reputação. Sim, o desejo que tenho de vossa salvação (que fala mais alto do que tudo quanto eu pudesse aqui deduzir) me forçou a proceder daquela maneira. Se porém se acham ressentimentos de mim, peço-vos que me perdoeis pelo amor de Deus. É chegado o momento para me despedir de vós; que pena, que sentimento tão vivo ocasiona esta despedida em minha alma, à vista do modo benévolo, generoso e caridoso com que me tendes tratado, penhorando-me assim bastantemente! São estes os testemunhos que me fazem compreender quanto domina em vossos corações tão belo sentimento! Adeus povo, adeus aves, adeus árvores, adeus campos, aceitai a minha despedida, que bem demonstra as gratas recordações que levo de vós, que jamais se apagarão da lembrança deste peregrino, que aspira ansiosamente a vossa salvação e o bem da Igreja. Praza aos céus que tão ardente desejo seja correspondido com aquela conversão sincera que tanto deve cativar o vosso afeto. 

[não discorrerei sobre detalhes, mas os estudiosos e historiadores atestam a autenticidade desse manuscrito encontrado em Canudos como de autoria do Conselheiro]

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